Introdução: O Destino Perdido de Dom Sebastião

Dom Sebastião, rei de Portugal, desapareceu na Batalha de Alcácer-Quibir, em 1578. Seu corpo nunca foi encontrado. Esse mistério alimentou a crença de que ele retornaria para restaurar a grandeza do país. Assim nasceu o sebastianismo, uma esperança mística e messiânica profundamente enraizada no imaginário português.  

Séculos depois, essa ideia ainda ecoava na literatura. Fernando Pessoa, mestre da poesia e do simbolismo nacional, resgatou o sebastianismo em seus versos, refletindo a saudade e a espera por um destino glorioso que nunca chegou.  

O Sebastianismo: O Sonho Português da Redenção

O sebastianismo não foi apenas uma lenda, tendo se tornado uma filosofia de vida, um estado de espírito português. Era a esperança de um futuro grandioso, mas sempre adiado. Mais do que esperar um rei, que certamente já havia falecido, visto que desaparecera séculos antes, os portugueses ansiavam por um renascimento nacional.  

Na literatura, essa crença atravessou gerações, e Fernando Pessoa a transformou em poesia. Para ele, o retorno de Dom Sebastião simbolizava não apenas uma restauração política, mas um despertar espiritual de Portugal (o fado, gênero musical lusitano, também reflete o mesmo ethos; falarei a respeito em um próximo artigo).  

Fernando Pessoa e o Sebastianismo: O Poeta da Espera e da Desilusão

Pessoa abordou o sebastianismo de diferentes formas. Às vezes, como um sonho utópico. Outras, como uma ilusão trágica. Três poemas, em especial, capturam esse sentimento.  

“D. Sebastião, Rei de Portugal”  

Neste poema, Pessoa personifica Dom Sebastião como um sonhador trágico, perdido entre a grandeza do passado e a incerteza do futuro.  

Louco, sim, louco, porque quis grandeza  

Qual a sorte não a dá. Não coube em mim.  

Não soube ter, nem ter-me, nem ter pressa  

A uma só fé. Vi. E assim foi o fim.  

***  

Quis ir além. E fui. A noite espessa  

Fechou-me a vista e a terra e o mar sem fim.  

Chegou a fúria e achou-me. A alma é essa.  

Na extrema solidão, em que enfim jazem,  

Os deuses todos, vejo-me a mim.  

Aqui, o rei perdido é um símbolo da própria identidade portuguesa: um povo que sempre quis mais do que a realidade lhe permitiu.  

“O Infante”

Este poema pertence à obra “Mensagem” e evoca o espírito da expansão portuguesa. Embora não mencione diretamente Dom Sebastião, ressoa com o sebastianismo ao expressar a nostalgia de um passado glorioso e a esperança de um futuro heroico.  

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.  

Deus quis que a terra fosse toda uma,  

Que o mar unisse, já não separasse.  

Sagrou-te e foste desvendando a espuma.  

***   

E a orla branca foi de ilha em continente,  

Clareou, correndo, até ao fim do mundo,  

E viu-se a terra inteira, de repente,  

Surgir, redonda, do azul profundo.  

O verso “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce” reflete a essência do sebastianismo: a crença no sonho como motor da história.  

“Quinto Império”

Outro poema de “Mensagem”, “Quinto Império” fala sobre o império espiritual que substituiria o império perdido. É uma leitura moderna do sebastianismo, onde a grandeza de Portugal não está na conquista de terras, mas na expansão da alma e do espírito.  

Triste de quem é feliz!  

Vive porque a vida dura.  

Nada na alma lhe diz  

Mais que a lição da raiz –  

Ter por vida a sepultura.  

  ***

Ergue a cabeça, e fita,  

Na limpidez do horizonte,  

O horizonte que lhe limita  

A alma que não transita  

De um limiar para a ponte.  

Pessoa sugere que a verdadeira missão de Portugal não é política, mas espiritual: um destino guiado pela visão e pelo sonho.  

Conclusão: O Fim de um Sonho, o Começo de Outro

O sebastianismo é mais do que uma crença no retorno de um rei. É o símbolo de um povo que vive de esperança, que sonha com um futuro glorioso, mesmo quando ele nunca chega.  

Fernando Pessoa capturou essa essência em sua poesia. Seus versos ecoam a grandeza sonhada de Dom Sebastião, mas também revelam a melancolia de uma espera infinita. Portugal nunca deixou de buscar seu destino — e talvez seja essa busca eterna que o define.  

Autor:

Barão Owekitinisa Davi Samuel Valukas Lopes (Nana Kofi Adom)

Mais informações sobre o Autor: instagram davivalukas

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